FÁBIO ANDRADE
Quando um azarão vence em algum esporte sempre é tempo de perceber que a probabilidade é uma ciência que pode induzir aos mais perigosos resultados, afinal, ao mesmo tempo em que indica o caminho aparentemente mais seguro a teoria da probabilidade pode estar dizendo absolutamente nada. Dessa forma, os que ontem imaginavam uma corrida chata acertaram a previsão. O GP de Abu Dhabi foi um porre, apesar de ter sido uma prova tensa em função da decisão do título. Os que apostavam numa corrida conservadora de Fernando Alonso também acertaram, em termos. O espanhol pisou em ovos na largada e não se opôs à passagem de Jenson Button na primeira curva, mas depois teve de partir para cima de Vitaly Petrov. E foi aí que a maior probabilidade de Alonso ser campeão caiu. O tricampeonato do espanhol parou na Renault do russo Petrov. E nem ao menos Mark Webber, o grande perseguidor do ferrarista na tabela, foi o vencedor da corrida e campeão do mundo. Webber falhou num dos finais de semana mais apagados do ano e corre o risco de voltar a sofrer com a pecha de pilotinho mais ou menos, apesar do grande ano que teve. Sebastian Vettel não fraquejou. Fez o que se esperava dele, contou com o Safety Car na primeira volta e agora comemora o título mundial que lhe era reservado desde que a Red Bull começou a prepará-lo.
Vettel venceu. Vettel é o mais novo campeão da história da Fórmula-1. Talvez mais do que o título de Vettel, um garoto admirado no mundo automobilístico pela sua incrível velocidade, a maior comemoração seja a derrota de Alonso, que não satisfeito com o papelão de Hockenheim, tratou de rodar a espanhola ao final da corrida e aumentar ainda mais a indisposição de grande parte do público à sua figura.
A primeira volta, o susto e um alemão decidindo o título
O circuito de Yas Marina é nababesco, como só a grana dos petrodólares pode conceber. Belíssimo no entorno, impossibilita quase que totalmente as ultrapassagens. Talvez por isso Alonso não tenha feito muita questão de impedir que Button o ultrapassasse na largada. O espanhol talvez imaginasse que sua preocupação maior deveria ser com Webber e que seria muito difícil para o australiano conseguir deixá-lo para trás. Alonso de fato partiu para uma corrida conservadora, não pretendendo correr riscos, mas não contava que um incidente com um antigo rival arruinasse seu ritmo de corrida.
Ainda na primeira volta Michael Schumacher se envolveu num toque com o companheiro de Mercedes Nico Rosberg. Rodou, ficou de frente para os carros que passavam e foi atingido perigosamente por Vitantônio Liuzzi. O susto foi grande, o bico do carro de Liuzzi passou a centímetros da cabeça do heptacampeão, mas ninguém se feriu. O Safety Car foi acionado e permaneceu na pista até a sexta volta.
[caption id="" align="aligncenter" width="499" caption="Liuzzi bate e atropela a Mercedes de Schumacher"]
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E foi nessa de Safety Car que Schumacher ajudou o compatriota Vettel. Na esteira do carro de segurança, vários pilotos da turma do meio aproveitaram para ir aos boxes de uma vez e trocar seus pneus para não mais parar para trocas. Quando, por volta do 15º giro, Alonso e Webber tiveram que parar, estava selado o destino do campeonato: os dois acabaram restritos ao desempenho de Vitaly Petrov, que jamais teve tanta visibilidade em uma corrida quanto nessa útlima prova da temporada 2010.
Alonso passou o resto da corrida brigando para superar Petrov, sem sucesso. A pista de Yas Marina não oferece pontos de ultrapassagem e exigia do bicampeão um lance de genialidade para validar seu desejado terceiro título. Só que esse lance não veio. Depois de quase 40 voltas colado na caixa de câmbio da Renault de Petrov, Alonso capitulou de forma patética ao completar as 55 voltas do GP de Abu Dhabi. Encostou ao lado da Renault gesticulando como se reclamasse, como se o russo tivesse alguma obrigação de deixá-lo passar para ser campeão. Aconteceu que Petrov não veste vermelho e não se chama Felipe Massa, logo, sem as marmeladas ferraristas, restou a Alonso o vice-campeonato. Se sua jornada em 2010 já estava manchada pelos acontecimentos do GP da Alemanha e se justamente por isso o espanhol e a Ferrari contavam com alta rejeição por parte do público, Alonso tratou de deixar sua derrota ainda mais ridícula. Não soube ganhar, também não soube perder e elevou o nível de sua já conhecida empáfia ao que se espera que seja o auge.
[caption id="" align="aligncenter" width="500" caption="Vice, Alonso pecou ao reclamar com Petrov"]
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(Um parêntese, necessário para que os alonsistas não peçam minha cabeça na caixa de comentários: Alonso é ótimo piloto, excelente, laureado com dois justos títulos. Talvez tenha sido o melhor piloto do ano pela reação incrível mesmo sem o melhor carro. O problema é que as atitudes do espanhol não são tão empolgantes como sua pilotagem. E é aí que ele perde a chance de se tornar um ídolo de verdade além das fronteiras da Espanha e do fanatismo ferrarista).
Apagado, Webber não fica nem com o vice
[caption id="" align="aligncenter" width="490" caption="Terceiro no mundial, Webber esteve em dia apagado em Abu Dhabi"]
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O campeonato teve diversos líderes durante o ano. Entretanto, no meio da temporada, foi Webber, junto com Hamilton, quem deu a impressão de que decidiria o título a ser favor com alguma tranqüilidade. Só que aquele piloto impecável de Silverstone e Mônaco desapareceu na parte final do mundial. Aos 34 anos, sem jamais ter sido protagonista na Fórmula-1, o australiano deu amostras de que sentiu a pressão. Os dois momentos que deixaram claros esses indícios se deram na corrida em Yeongam, quando cometeu um erro primário que o tirou da prova e ontem na classificação de Abu Dhabi, quando não passou do quinto lugar. Na última corrida do ano, voltou a demonstrar algum nervosismo quando tocou de leve o guard-rail no último trecho da pista e não se aproximou de Alonso em nenhum momento. Depois de rachar o time, reclamar da equipe e de conseguir a simpatia da maioria dos torcedores que o consideraram injustiçado dentro da Red Bull, Webber falhou na tarefa mais importante que era acompanhar o desempenho de Vettel. Por nunca ter sido um grande piloto, é provável que comece o ano contestado na Red Bull em 2011. O australiano provavelmente perdeu a chance de dar o último grande show.
O nome é Vettel, não Hamilton
Em determinado ponto de 2010 Sebastian Vettel teve seu nome ligado ao de Lewis Hamilton. A semelhança entre os dois jovens pilotos cheios de talento que desperdiçaram diversas chances durante o ano era, de fato, grande. Com o agravante de que Hamilton só errou nas duas últimas provas de 2007, enquanto Vettel distribuiu seus erros por todo o ano de 2010. É bem verdade também que o equipamento do alemãozinho o deixou a pé algumas vezes sem que Vettel tivesse culpa. Mas o título acabou entregue ao piloto que se não é o mais regular do ano, sem dúvidas é o mais rápido. Vettel cravou nada menos do que 10 das 19 poles possíveis em 2010. Um aproveitamento de mais de 52% em classificações.
[caption id="" align="aligncenter" width="490" caption="O garoto comemora: Vettel, o mais jovem campeão da história da F-1"]
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Vettel ganhou cinco corridas em 2010, mesmo número de vitórias de Alonso, contra quatro de Webber, três de Hamilton e duas de Button. No fim das contas, o resultado do mundial não foi nada injusto. O melhor carro foi campeão entre os construtores e carregou a bordo o campeão de pilotos. Aos 23 anos, quatro meses e 11 dias, Sebastian Vettel é o mais jovem campeão da história da Fórmula-1.
Grande Prêmio de Abu Dhabi, resultado após 55 voltas: