Debruçar-se sobre tudo o que aconteceu no GP da Turquia seria loucura. Em todas as 58 voltas da corrida em Istambul havia pontos de tensão. De Button e Hamilton revivendo o duelo de 2010 nas mesmas curvas esse ano até Schumacher se enroscando com adversários em carros mais fracos, passando por Massa e Button se enfrentando durante boa parte da corrida. Ação não faltou no GP da Turquia e esse parece ser outro ponto fundamental dessa temporada. Há uma hiperestimulação em curso. Seja nos volantes do carros, recheados de botãozinhos e traquitanas, até a transmissão televisiva. É difícil ter 5 minutos para ir ao banheiro durante as corridas, mas não me parece lícito reclamar por causa de corridas divertidas. Melhor assim do que as procissões burocráticas.
[caption id="" align="aligncenter" width="500" caption="Hamilton e Button duelam. E é sempre bom ver companheiros de equipe disputando abertamente"][/caption]
Mas se é verdade que as corridas seguem num ritmo de acontecimentos muito veloz, há também muita informação para apurar. E a Fórmula-1, que deseja sempre ampliar o volume de espectadores, enche a tela de informações durante toda a corrida. Já não basta saber quem está em qual posição, mas também quantas voltas ele já deu com aquele pneu, qual o tipo de pneu foi ou não usado por determinado piloto... As corridas estão se decidindo na pista, sim, mas elas estão totalmente envoltas em informações abstratas que nem sempre ficam claras para o espectador médio. Exige-se uma certa “ciência” para entender as corridas e não necessariamente há demérito nisso. Só não parece ser a tática mais inteligente para quem quer ganhar público.
Uma das ferramentas que talvez endosse esse tipo de percepção é a asa móvel. É preciso saber em que ponto da pista ela pode ser usada e a partir de que volta ela pode ser acionada. E para que não restem dúvidas sobre o momento em que o piloto abre o aerofólio traseiro mais um gráfico foi adicionado à transmissão. As ultrapassagens acontecem na pista e não nos boxes, e esse era o objetivo sonhado que se tornou realidade. Ok, mas para o espectador médio entender os motivos que levam o piloto A a passar o piloto B com tanta facilidade ainda dependem de um repertório teórico e virtual que era dispensável até o fim de 2010.
O fim da disputa
Outro efeito nefasto do uso da asa móvel é a quase abolição das brigas por posições. Em algumas disputas no Istambul Park o piloto da frente ficou totalmente impossibilitado de ter reação diante da ultrapassagem iminente. Dessa forma, o “show” tão ansiosamente planejado por Bernie Ecclestone sai prejudicado. Não há show quando um piloto ultrapassa o outro como se um estivesse com motor turbo e outro com um simples aspirado.
[caption id="" align="aligncenter" width="500" caption="Webber acionou a asa e passou Rosberg sem tomar conhecimento. Onde está o show?"][/caption]
Isso, porém, parece não representar um problema para as cabeças que pensam a Fórmula-1 e que lucram com ela, pelo menos por enquanto. Porque o hiperestímulo a que me referi no início inebria os sentidos dos espectadores e da imprensa. Todo mundo ainda vai falar muito no recorde de pit stops e no expressivo número de ultrapassagens que aconteceram em Istambul. Preocupar-se com a consistência dessas ultrapassagens só quando o efeito novidadeiro dessas traquitanas passar.
Por isso, talvez, eu seja mais simpático aos pneus voláteis da Pirelli do que à asa móvel. Os pneus forçam a ocorrência de muitas ultrapassagens, mas também, pelo menos por enquanto, possibilitam a existência de estratégias de corridas diferentes. E isso já é uma grande coisa quando olhamos em perspectiva para as temporadas passadas, quando as táticas eram todas iguais e todos se encontravam nas mesmas condições durante toda a corrida. As muitas paradas nos boxes são um efeito colateral aceitável se a corrida tiver atrativos como pilotos com pneus em diferentes estágios de degradação e brigas por posição na pista. Os mais puritanos ainda chiam diante do alto número de pit stops, mas é interessante perceber esse novo comportamento como um comércio. Em troca de mais disputas na pista há mais paradas de boxes, apesar da aparente incongruência dessa afirmação.
E a corrida?
Deixando de lado essa parte substancial da Fórmula-1, tivemos uma corrida animada, não dá para negar. Mas animada da segunda posição para trás. O nome de Sebastian Vettel está, cada vez mais, sendo acompanhado pelo epíteto “genial”, com toda justiça. Não só ele tem sido genial, mas sua equipe, na maior acepção da palavra, também vem apresentando um desempenho irrepreensível. Adrian Newey projeta um foguete. Christian Horner não vem tendo muito trabalho para comandar a dupla de pilotos, visto que Webber não anda ameaçando o alemãozinho. E o time trabalha de forma impecável nos boxes, sem erros e com uma velocidade sempre melhor do que a dos rivais. Diante de um quadro desses o que o piloto precisa fazer é aproveitar esse potencial pilotando no mais alto grau de competência. Vettel está fazendo o que no jargão da Fórmula-1 se chama de “pilotar como um campeão”. E isso ele já é. Até porque o alemãozinho já possui uma vitória de grande carga simbólica: todos os rivais sofrem a influência do novo regulamento e passam a corrida toda sob algum tipo de risco, sob ameaça de perder posição para algum rival ou com a perspectiva de um pit stop de última hora por causa do consumo dos pneus. Vettel vence corridas tranquilas lá na frente. O campeão de verdade é o único que triunfa até mesmo sobre o regulamento.
[caption id="" align="aligncenter" width="500" caption="O time saúda Vettel. A Red Bull dá uma aula de eficiência para as rivais"][/caption]
Grande Prêmio da Turquia, resultado após 58 voltas:
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7 comentários:
Muito bom o post. Enfim um comentarista do melhor esporte do mundo que mostra opinião e racionalidade sem vestir a camisa,digo, o macacão verde e amarelo. Como, infelizmente, alguns jornalista fazem, passando por cima da informação. Sempre acompanho. Parabéns!
Fábio,
Como disse, foi uma corrida recheada de ação do inicio ao fim, por todo canto.
É verdade que existe artificialismo com pneus que viram farofa e asa móvel, é tanta parada que os mecanicos piram...
Apesar de tudo isso, as corridas estão bem divertidas. Por hora, deixo meu conservadorismo de fora!
abs
Valeu, @daviksama. Muito obrigado a continue acompanhando e participando.
Marcelonso, só não consigo gostar da asa móvel. Me parece acintoso, exageradamente desleal com o piloto que vai na frente. Espero que seja repensado para 2012, para 2011 parece não mudará.
Nao entendi se afinal, é a favor ou contra a asa. Eu continuo contra. Lembro que apos as corridas nós tinhamos as analises das disputas. Alonso x Webber. Button x Hamilton... etc. Agora, fica impossivel fazer isso, pelo fato de nao haver mais disputas. A dita categoria maxima do automobilismo... onde andam os melhores pilotos do mundo, ultrapassar nunca foi tao facil - nao existe mais merito nenhum em passar outro piloto, seja ele campeao ou sete vezes campeao. Agitadas as corridas estao sim, mas disputadas, nao. E a graça pra mim do automobilismo esta na disputa. Antigamente uma ultrapassagem ou disputa ficava na historia, por exemplo, senna x piquet, hakinnem x scumi em spa, ate mesmo a do massa no canada passando 2 caros no hairpin... agora nao, nenhum dessas ultrapassagens vao pro album das memoraveis. Pro ano que vem so falta o pista alerta. A combinacao asa + pneus polvilhos... matou e sepultou as disputas. E finalmente: concordo que pra um espectador medio, ta dificil saber o que é o que. Toda corrida tem q ficar escutando o galvao repetir pela centelhessima vez sua explicacao sobre o kers e sobre a asa movel - com aquela entonacao chata de repeticao mesmo... e no final das contas ninguem que ja nao entenda do assunto vai entender. Quanto ao campeonato... já era. Viuva beijada... caixao fechado e missa rezada. Agora so ano q vem...
concordo que prefiro ainda o pneus de pelúcia do que a asa móvel, é injusto demais um passa o outro assim sem ter como se defender.
ah e sobre a Corrida, pra mim Vettel é "unstoppable". Até o Webber que tem o mesmo carro, se rendeu a ele, tá na hora dos outros fazerem isso também...
Se vc não entendeu, Williams, quem não soube explicar fui eu :s
Depois de quatro corridas já posso dizer que também não gostei da asa móvel. É o único dos itens que estrearam (ou reestrearam no caso do KERS) que me deixa 100% insatisfeito. A disputa pela posições praticamente acabou e, além disso, as ultrapassagens estão dependendo menos da técnica e mais do aperta-aperta de botões.
Marcão, dá até pra duvidar que o RB7 do canguru é o mesmo que o Vettel usa, mas de teorias conspiratórias já bastam as que pipocaram sobre a morte do Bin Laden, hehe.
Sobre as asas moveis, vi uma estatistica que ilustra bem o que tá acontecendo. A f1 desse ano tem a maior media de ultrapassagem de todos os tempos! Foram 113 ultrapassagens na Turquia. Ou seja, aumentaram o tamanho do gol em 10x3 metros e as partidas estao terminando em 38x27. Banalizaram totalmente a ultrapassagem, tirando dela toda a emocao que é a disputa. Ta dificil da FIA acertar a mao. So acho que vai melhorar mesmo, se reformarem os tilkodromos.
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