FÁBIO ANDRADE
O título do mundial de construtores conquistado na tarde desse domingo pela Red Bull em Interlagos dá ao time alguma tranquilidade para disputar o outro mundial ainda em aberto, o de pilotos, que terá seu desfecho no domingo que vem, no GP de Abu Dhabi. Já no GP do Brasil, o que se viu foi a equipe austríaca vencer com tranqüilidade em São Paulo, com Sebastian Vettel liderando a dobradinha da Red Bull, complementada por Mark Webber. Vettel chega assim à quarta vitória no ano, se mantendo vivo na disputa pelo título. Não houve ordem de equipe para que o alemãozinho favorecesse Webber e dessa forma Fernando Alonso continua na ponta do mundial de pilotos depois do terceiro lugar conquistado pelo espanhol na corrida brasileira.
[caption id="" align="aligncenter" width="490" caption="A dobradinha em Interlagos garantiu o título de construtores para a equipe Red Bull"]
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Quatro pilotos vão chegar em Abu Dhabi com chances de levar o mundial. Jenson Button se despediu da briga pelo título no Brasil e seu companheiro de equipe ainda preserva alguma possibilidade de faturar a taça, mas ela é extremamente remota. Lewis Hamilton chega ao oriente médio com 24 pontos de desvantagem em relação ao líder Alonso. Precisa de um grande milagre para terminar o ano com o bicampeonato.
Mas Abu Dhabi ainda é na semana que vem. Nesse domingo a corrida foi no Brasil, no belo Interlagos, na pista que proporciona show e muitas ultrapassagens. Havia grande expectativa em torno da prova na pista paulista. Mas depois das 71 voltas ficou no ar a sensação de que algo saiu abaixo do esperado.
Alguém faltou ao grande encontro
[caption id="" align="aligncenter" width="499" caption="Vettel pulou tomou o primeiro lugar de Hulkenberg antes mesmo da primeira curva"]
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Não dá pra falar do começo da corrida em Interlagos sem citar Nico Hulkenberg. A lógica dizia que o jovem alemão, largando da pole, não resistiria por muito tempo às investidas dos carros mais fortes. Dito e feito, a liderança de Hulkenberg não resistiu à primeira curva. Antes mesmo do S do Senna o alemãozinho da Williams já havia sucumbido ao alemãozinho da Red Bull, Sebastian Vettel. Hulkenberg deu algum trabalho a Mark Webber, que concretizou a ultrapassagem poucas voltas depois. O próximo a encarar o pole seria Lewis Hamilton, mas o britânico estava mais preocupado com a aproximação de Alonso. Uma bela briga entre os campeões chegou a se delinear, mas Hamilton escorregou na saída da Curva do Lago ainda na segunda volta, fugindo de uma disputa que prometia ser boa. Na mesma Curva do Lago onde em, 2007, Hamilton começou a ver seu campeonato desmoronar a não-briga mais palpitante do GP do Brasil de 2010 aconteceu.
Alonso passou então a atacar Hulkenberg, que deu bastante trabalho, segurando o espanhol na caixa de câmbio de sua Williams até a volta de número 7, quando foi, finalmente superado. Só que nessa altura, Vettel e Webber já haviam se destacado do restante do pelotão, e faziam uma corrida só deles.
[caption id="" align="aligncenter" width="499" caption="Webber em 2º, Hulkenberg em 3º e Hamilton se defendendo de Alonso na freada do S do Senna"]
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Quando conseguiu ultrapassar o piloto da Williams, Alonso já levava 12 segundos de prejuízo em relação aos Red Bulls. Em quarto lugar, Hulkenberg continuou a conduzir bem, impedindo Lewis Hamilton de ultrapassá-lo até que a equipe Williams finalmente o chamou para trocar os pneus. Depois disso Hulk sumiu das câmeras, mas teve suas 10 voltas de fama na Fórmula-1.
Pouco depois começaram as paradas para troca de pneus. O destaque foi Button, um dos primeiros a parar, que conseguiu sair da nona para a quinta posição. A nota triste foi o trabalho de box infeliz da Ferrari, que não fixou bem a roda dianteira direita no carro de Felipe Massa, obrigando-o a voltar aos boxes na volta seguinte para terminar o serviço.
Alonso e os dois Red Bulls foram aos boxes entre as voltas 24 a 26. O espanhol foi o primeiro a parar, seguido de Vettel na outra volta e Webber na seguinte. As paradas encerraram a primeira parte da corrida, sem incidentes sérios e até então sem Safety Car.
A corrida mergulhou então em sua fase mais morna. Passada a tensão da largada e das paradas nos boxes, Vettel liderava com cerca de 3 segundos de vantagem para Webber, que tinha quase 10 segundos de margem sobre Alonso. As voltas atrás de Hulkenberg custaram a Alonso a chance de estar mais próximo das Red Bulls. A expectativa por diversas brigas por posição alimentadas assim que o grid se definiu no sábado foi se tornando um enjoado conformismo com uma corrida sem disputa entre os líderes do mundial.
[caption id="" align="aligncenter" width="499" caption="Distante dos líderes da corrida, Alonso ficou com o 3º lugar"]
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Alguém faltou ao grande encontro. Era em Interlagos que os líderes deveriam discutir o mundial 2010. Na próxima corrida em Abu Dhabi ninguém espera que chovam ultrapassagens. Se havia algum lugar para que os concorrentes ao título resolvessem suas diferenças na pista, esse lugar era São Paulo. Afinal, o histórico recente garante a pista brasileira como uma das que mais proporcionam ultrapassagens e elas aconteceram em bom número no meio da fila. Só foram raras entre os que brigam pelo campeonato.
Alguém faltou ao grande encontro. Hamilton e Alonso poderiam ao menos ter ensaiado um confronto no começo da corrida, mas o britânico abriu mão da briga ao escapar no Lago. Depois, da volta 40 até o acidente com Vitantônio Liuzzi, Webber também ameaçou começar a disputar a liderança da prova com Vettel. Só que sempre que o australiano se aproximava do companheiro alemão, um retardatário surgia e o fazia perder tempo. No 52º giro Liuzzi bateu na Curva do Sol e obrigou o Safety Car a entrar em cena. Depois disso Webber não conseguiu mais se aproximar de Vettel. Nas voltas finais o grande encontro ameaçou se dar entre Alonso e Webber, mas faltou tempo para que o espanhol se aproximasse. E tudo terminou como estava.
[caption id="" align="aligncenter" width="396" caption="A grande briga que não houve em Interlagos: Sebastian Vettel e Mark Webber"]
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Na revista Veja do dia 19 de setembro de 2001 o ensaísta Roberto Pompeu de Toledo entitulou assim seu artigo na última página do semanário: “alguém faltou ao grande encontro”. Toledo se referia aos atentados que abalaram Nova Iorque e Washington uma semana antes, e sobre como eles despertavam uma guerra da “invencível América” contra os rotos afegãos:
(...) trata-se de guerra contra quem? Eis o problema. É uma guerra em que falta o outro lado. Se o leitor tem em mente os palestinos, que raio de adversários são esses – pouco mais que um bando de favelados, armados mais freqüentemente de paus e pedras que de outra coisa? Se tem em mente o Afeganistão, que raio de adversário é esse, cujas lutas tribais o situam a um degrau da Idade da Pedra? Não. Não dá para imaginar a Terceira tendo como oponentes, de um lado, a super e invencível América, e do outro os esfarrapados palestinos, ou os obscuros afegãos. Eis outro paradoxo, o maior, dos eventos da semana passada. Ao desencadear a Terceira Guerra Mundial, o outro lado faltou. Foi como um encontro marcado em que um dos lados, na hora H, não dá as caras. Ou como a noiva que deixa o noivo só no altar. (...)
E assim foi o GP do Brasil. Alguém faltou ao grande encontro não porque as Red Bulls são a América invencível e os rivais são pobres coitados montados em carroças ou em carrinhos de rolimã. Alguém faltou porque na corrida que tinha tudo para, finalmente, marcar com grandes brigas e grandes imagens a discussão do campeonato mais esperado e mais equilibrado dos últimos anos, ninguém brigou. Vettel, Webber, Alonso e Hamilton não se enfrentaram. Cada um ficou na sua. E o público ficou do lado de cá, aguardando sem muitas esperanças que em Abu Dhabi se produza, enfim, alguma imagem marcante que sirva como símbolo e memória da Temporada 2010 no futuro.
O campeonato de pilotos vai para o GP de Abu Dhabi, o último do ano, assim: Alonso líder com 246 pontos. Webber atrás com 238. Vettel tem 231 e Hamilton, praticamente fora da briga, tem 222.
Grande Prêmio do Brasil, resultado após 71 voltas: