sexta-feira, 30 de julho de 2010

Senna fala sobre Massa e a cruel torcida brasileira



FELIPE MACIEL



Já cogitei fazer um post reunindo algumas declarações de pilotos sobre a polêmica, mas perdi o interesse. Não eram comentários tão interessantes assim. Tem piloto que é declaradamente a favor da ordem de equipe, como Schumacher e Webber. Tem quem se posicione contra, como Button. Tem quem use o episódio da Alemanha para mostrar ao público por que Áustria-2002 aconteceu. Mas nenhuma entrevista acrescentou tanto quanto à de Bruno Senna, e por isso só o bate-papo dele com os jornalistas brasileiros mereceu destaque aqui.

A sinceridade e a compreensão macroscópica do piloto da Hispania é a mais pura verdade que quem está de fora às vezes não percebe.
Fórmula 1 é um negócio antes de ser um esporte. O esporte são os pilotos, o negócio são todas as outras pessoas que estão ali dentro.

Bruno Senna



Sim, a Fórmula 1 é antes de mais nada um negócio. Ela nasceu do negócio. Quando se praticou F-1 pela primeira vez, como foi? Alguém pegou um par de chuteiras e uma bola e saiu jogando? Pegou uma raquete e um par de tênis e começou a passar a bolinha por cima da rede? Não. Antes de existir competição de Fórmula 1 era necessário existir dinheiro, engenharia, fornecedor, carro... os pilotos são a última peça do quebra-cabeça para que se concretizem as corridas.

Um negócio que vira esporte; um esporte que, quanto mais cresce, mais próximo do negócio fica. O raciocínio básico do jogo de equipe da Ferrari - de ganhar a qualquer custo - é o mesmo que leva o Ecclestone a virar as costas para a França e inventar GP em Abu Dhabi. Essa é só uma constatação da dura realidade deste esporte. Não significa que devemos aceitar nada, apenas uma constatação de sua natureza, repito. Mas a parte mais interessante da entrevista vem a seguir, com o repórter Felipe Motta dialogando com Senna a respeito do comportamento da torcida brasileira diante da manipulação em Hockenheim.



O piloto brasileiro se encontra numa situação muito difícil. Eu conversei com jornalistas do mundo inteiro e eles me disseram que quando há ordem de equipe no país deles, a torcida fica incomodada mas direciona muito de sua revolta para a equipe porque ela tem esses valores de autoridade e de expectativa. Não que o brasileiro não tenha isso de respeitar autoridades. Tem, mas eles vinculam a F-1 ao piloto e ao país como se fosse uma Olimpíada. F-1 é uma Olimpíada?

Felipe Motta




Esporte é esporte. Pelo que eu sinto da torcida brasileira, o esportista brasileiro tem obrigação de vencer, como na Copa. A seleção brasileiro chega na Copa com a obrigação de vencer. Não é justo para ninguém lidar com esse tipo de pressão. Todo mundo que disputa um esporte de alto nível como é a F-1, como é a Copa... a competição é forte, ninguém tem a obrigação de ganhar nada. Não existe alguém que seja tão extraordinário que não exista competição. As pessoas têm de entender que o esporte é competição. Ninguém é invencível.

É uma coisa que todo mundo tem de se educar, aprender a torcer pelo sucesso do esportista, e não só pela vitória. Ele pode ser bem sucedido, mesmo não sendo o campeão, o melhor de todos os tempos. É uma profissão: você faz porque gosta e não porque você só pode ser campeão. (...) O esportista quer o torcedor que torce pelo sucesso dele, não que o odeie quando ele não obtém o sucesso que foi projetado. Acho que é uma questão de educação.

Bruno Senna



A conversa prosseguiu com o jornalista avaliando que o público se sentiu lesado pela manobra da Ferrari, já que na óptica do torcedor, o esportista pode ter sucesso ou insucesso desde que tenha perdido na pista, algo que qualifica o episódio como indigno. Bruno comenta ser difícil argumentar que se entregue um GP de mão beijada ainda no meio da temporada, mas contrapõe que às vezes se sacrifica uma corrida para ganhar coisas mais à frente.

Enfim, não cabe aqui reproduzir todos os melhores momentos da conversa, por isso deixo o link com áudio da entrevista completa.



Tenho a sensação de que o Brasil é o pior país para se nascer caso se pretenda ser um piloto de Fórmula 1. Vejo comentários dizendo que Massa virou o novo Rubinho. Pois bem, quando foi que Rubinho virou Rubinho? Foi na Áustria há 8 anos? E bastou o Massa executar ato semelhante agora na Alemanha para ele "entrar para o clube"?

Aí é que está. O público brasileiro tem a incrível capacidade de se deparar com uma cena revoltante e apagar todas as demais passagens da carreira de um piloto, deletar todas as qualidades que reconhecia no esportista e dizer que se recusa a torcer por ele novamente.

Se no lugar do Felipe, o Kubica fosse o companheiro do Alonso a abrir para o espanhol, ninguém aqui passaria a ignorar o potencial do polonês e tudo o que ele já mostrou na Fórmula 1. Nem aqui nem na Polônia, nem em canto algum.

O povo brasileiro leva casos como este para o lado pessoal. O que me remete inevitavelmente àquela velha frase: "triste do país que precisa de heróis". Não vou argumentar que não se deve condenar o Felipe e depositar sobre ele a carga de responsabilidade pelo caso; seria inútil. Neste país, busca-se um novo Senna e nada menos que isso. Nunca vão encontrar e nunca desistirão de procurar. E o caráter implosivo da torcida brasileira seguirá destruindo ídolos de respeito.

Não que isso me afete. Não sou eu quem precisa de piloto brasileiro para assistir Fórmula 1.

18 comentários:

Ron Groo disse...

O que quis dizer o Senninha com isto? Negócio antes de ser esporte, e esporte são os pilotos.
E Massa é o que? Não é piloto?

A torcida brasileira não é cruel, os pretendentes a ídolos é que são bananas.

Daniel Santos Machado disse...

BOm post e boa entrevista essa do Bruno Senna. Brasileiro pe mal perdedor mesmo, sempre acha que vai ganhas e todas as vezes como na copa do mundo e se perde fica reclamando e xingando. A mesma coisa na F1 e vai ser em qualquer esporte.

Daniel Santos Machado disse...

Claro que eu não quero que nenhum pilot e time que eu torça perca, não, mas é que as derrotas acontecem e não adianta xingar pois não muda em nada as coisas!

Bruno Flávio disse...

Não nego que, quando vi a mensagem rádio, percebendo o óbvio, ou seja, a troca iminente de posições, dei aquela broxada... A corrida meio que perdeu o briho para mim.

Mas, bastaram alguns minutos para perceber que aquilo é normal. A Ferrari é uma empresa. Deu a ordem que lhe pareceu mais adequada aos seus fins naquele momento. E, cá entre nós, estando o Alonso muito na frente no campeonato, era a ordem adequada mesmo.

E por falar em Alonso, ele sim é que irá escutar, para o resto da vida, que só ultrapassou porque o Massa deixou. Como disse o Piquet, que ultrapassou pelo rádio.

E, cá entre nós: se o Massa não deixasse, não passava mesmo!

E eu engrosso a lista daqueles que, havendo pilotos brasileiros correndo, bom. Não havendo, bom também!

Pinheirinho - Brasília/DF., Brasil. disse...

Em 2002, Ferrari mandou Barrichello abrir para Schumacher. Brasileiro critica, mas não põe lenha, e alemão dedende equipe.
Para Schumi, ordem da Ferrari deveria ter sido mais sutil, não de forma tão óbvia como foi.
Pinheirinho é divulgador cultural é maranhense, a partir de Brasília. - E-mail: pinheirinhoma@hotmail.com

Alessandro Resta disse...

Não quero me alongar muito. Quero dizer que concordo em grande parte com o post. O que disse o Bruno e o que completou o autor me pareceu justíssimo. No entanto, eu pessoalmente discordo da aceitação da F1 como pura e simplesmente um negócio. Tudo bem, também faz sentido que o seja. Mas mesmo que a F1 seja um "negócio esportivo", não caberia ao público aceita-lo como tal? Quero dizer, sendo business ou não, o alvo é espectador. Não é questão de desligar a TV caso as expectativas não sejam cumpridas, o fato é que se a F1 quer permanecer como categoria de ponta e viva no gosto da audiência/consumidor as regras e tudo que a gente vê na categoria tem ir ao encontro da demanda do público. É o mesmo raciocínio para o campeonato de automobilismo, para as regras do tênis ou de uma empresa que quer continuar vendendo o seu produto.
Parece radical, mas principalmente com o espaço que a web criou, é o espectador que tem o poder sobre o quer ver. Já foi o tempo, como o da era da televisão, em que teríamos que admitir passivamente o que nos fosse oferecido. A web acabou com o monologo da TV, e apenas uso a palavra web pq ela sintetiza a principal qualidade da nova audiência. Somos nós que decidimos aceitar jogos de equipes bisonhos como estes ou se queremos uma disputa mais limpa nas pistas. Seria falta de competência administrativa se quem organiza a categoria resolvesse não considerar o que o público quer ver.
Acredito que sobre esse ponto de vista, sim, a F1 pode mudar, e, sim, a FIA tem que prestar mais atenção ao que a audiência quer.
A questão não é a F1 deixar ou não de ser um negócio. Como foi dito, faz parte da natureza do esporte. O ponto é que o produto seja de qualidade.

Tweets that mention Senna fala sobre Massa e a cruel torcida brasileira « Blog F-1 -- Topsy.com disse...

[...] This post was mentioned on Twitter by Jule Santos, Rádio OnBoard. Rádio OnBoard said: Senna sobre Massa e a cruel torcida brasileira. Analisemos: http://blogf-1.com/2010/07/senna-fala-sobre-massa-e-a-cruel-torcida-brasileira/ [...]

Anderson Nascimento disse...

Creio que Bruno só defendeu seu compatriota. O que Massa fez não tem muita explicação e a crueldade não parte da torcida, mas sim de um piloto que entra na pista para vencer e sanar as expectativas de milhões de torcedores e entrega a vitória sem motivos convincentes para outro.

Humberto M. Oliveira disse...

concordo com tudo o que você diz sobre o "negócio F-1". perfeito. Mas acreditos que sim, nós brasileiros ficamos mau costumados em função de emmo, senna e piquet. Rubinho é um grandissíssimo piloto, mas... não é um campeão e o que se viu na semana passada é que massa é também (continua sendo), um grandessíssimo piloto, mas não é nem será (como eu acreditei que seria por causa de 2008), um campeão, como os outros que eu citei, porque nenhum deles deixaria companheiro nenhum passar. Assim como o vettel, o hamilton ou o kubica também não deixariam, esses serão com certeza grandes campeões. E nós, a torcida brasileira, devemos respeitar os rubinhos e os massas e davemos aguardar, quem sabe, um novo piquet ou um novo senna, seria legal.

edu disse...

O q esse Senna tá falando??....Sou torcedor. No futebol torço para o meu time ganhar, é o óbvio. Agora como vou continuar torcendo para um piloto q não pode ganhar?..Só se eu fosse um completo imbecil. Não procuro herói, procuro esportista sério.

carlos disse...

Ídolo de respeito? Tal atitude do Massa não foi a de um ídolo e muito menos respeitosa, e esse é o ponto, por isso a revolta. O resto é blá blá blá.

Williams disse...

Não basta apenas vencer... o negócio é convencer. Acho que todo mundo gosta do jeito do Santos de jogar bola..., e até agora não ganhou nada; só um paulista em cima de um time sem tradição. Teve muitos pilotos que não ganharam campeonato mas que convenceram em suas passagens pela F1: Reutemann, Jacky Ickx, Ronnie Peterson, Stirling Moss, Gilles Villeneuve e até mesmo o Montoya. É difícil existir um piloto que convença e que não vença... geralmente ou são muito bons, ou medíocres ou ruins, que não se encaixam na F1. O problema Felipe Maciel, é no brasil existe uma emissora chamada Globo! Pra ela não existe piloto brasileiro medíocre ou ruim. Ela não transmite a F1 por causa do automobilismo em sí; mas sim pela torcida a um piloto brasileiro; e o povo que não vê nada alem da F1 pela globo acredita nisso; ou seja 90% dos espectadores. Quem vê uma transmissão da F1 pela BBC ou qq outro canal (sem ser espanhol ou italiano) vai notar claramente a diferença de abordagem. Os caras transmitem o automobilismo e não os pilotos de seu pais. Basta ver com olhos imparciais algumas corridas que nenhum desses brasileiros do grid estão acima da média, mas pra globo... os caras estão acima de tudo e todos. O que a globo faz com os pilotos brasileiros é uma patriotada idiota; o galvão é um urubu de piloto! O cara é patrinho de casamento do massa! Vai falar o que pro publico? que o cara é medíocre? nem pensar... o massa é genial e etc... enfim: a globo não ta lá pelo automobilismo; até porque só começou a transmitir quando um brasileiro começou a andar bem.

karkara disse...

No geral pro brasileiro acompanhar algum esporte tem que ter um "herói" brasileiro na disputa e em condições de vencer. Isso tem grande influência da imprensa brasileira, onde qualquer campeonato é elevado ao status de "guerra", e os esportistas são elevados a categoria de "heróis nacionais" mesmo nem sendo bons!... seja nas propagandas, seja com os locutores, seja em matérias do tipo: "vamos secar o Button" ou "Lúcio, bota o Messi no bolso"! A verdade é que a torcida brasileira em sua grande maioria é feita por fanáticos, que levam tudo para o lado pessoal - vêem no esporte uma válvula de escape para as mazelas de nosso país. Engraçado, nas urnas não vejo nada disso, nada desse entusiasmo, desse povo crítico, dessa patriotada... É cada um olhando pro seu umbigo e o coletivo que se exploda... que moral que um povo como esse tem pra falar de um piloto que abre pro outro seja pra manter o seu cargo seja pra ganhar mais grana? O Massa não fez nada que nós fazemos aqui no Brasil a 500 anos, ano após ano. Os brasileiros são os aiatolás do esporte - é tudo extremista - POREM, nossos atuais pilotos tem uma boa parcela de culpa nessa história: que moral tem um piloto que participa de um quadro de humorismo onde ele é chamado de Pé de Chinelo e ainda se acha o máximo? qual é a imagem de um piloto que se sujeita a bater no muro pra seu companheiro ganhar uma corrida tem? Se for pra correr numa categoria pra se sujeitar a esse tipo de coisa, faz que nem o Haikonem, vai fazer outra coisa que gosta... e ponto final; vai andar de Indy, WTCC, sei lá; tem pilotos que se humilham pra permanecer na F1; o cara muda seu carater, desvia dos seus próprios princípios! Dá pra ver nas entrevistas que o cara tá mudando. Isso sim é triste. Tirando a patriotada, eu acredito que todo mundo gostaria de ver de qualquer piloto que seja é maturidade e sinceridade! Discurssos como esse do Massa... aquele do Hamilton no caso da mentira... são lamentáveis.

Dea disse...

Sabe, Maciel, você tem muito de razão nas suas palavras.
Não fiquei indignada nem nada com o acontecido pq sempre achei Massa um bom segundo piloto. Ceder a posição bem no meio do campeonato quando ainda se tem chances (matemáticas) é bem prova disso. E não adianta fazer cara de bravo, já que ele mesmo afirmou que tomou a decisão.
A revolta do povo é pq ele e a Globo vendem a imagem de que ele é o futuro campeão brasileiro na F1. Aquele marketing do macacão verde e amarelo... faz favor. Tava bem na hora de acontecer uma presepada dessas pro povo se tocar.

[]s

Defourt disse...

Ótima entrevista realmente.

Mas péra aí! O pior é a torcida que exige um vencedor ou a equipe que também o exige?

Longe de mim culpar o MASSA que é o último a ser responsabilizado. Mas exigir da torcida que se comporte de uma maneira e abonar as equipes com a desculpa de que é um NEGÓCIO não seria hipocrisia?

Se é realmente uma questão de educação apenas a torcida tem que se educar?

Então que se mude ou crie um regulamento onde a competição
premie a competição "educada" (correta) e não o "negócio".

Pois do jeito que está é simplista demais se exigir da torcida e fingirmos não ver o que as equipes são capazes de fazer para se vencer.

É a torcida quem faz isso aí de baixo?

- Espionagems;
- Já forjaram acidentes para que o ALONSO fosse o beneficiado.
- Equipamentos fora do padrão das regras para se levar VANTAGEM etc.

Ah! sim mas isso é NEGÓCIO tudo bem...

Tudo pelo NEGÓCIO!
Ética pra quê se o que importa é o negócio?

O "NEGÓCIO" é o seguinte: Não se faz mais "negócio" como antigamente...

Cassius Clay Regazzoni disse...

Felipe,

Obrigado pela resposta, é muito bom quando existe uma discussão em alto nível com a que está aqui colocada, desculpe alguns termos mais fortes mas é a indignação pelo episódio, tenha certeza de que irei continuar a dar meus pitacos neste espaço.

Um grande abraço,

Cassius.

Arthur disse...

Eu acho que o Bruno Senna se esqueceu das coisas que o seu saudoso tio disse certa vez:

"Brasileiro só aceita título se for de campeão. E eu sou brasileiro".

"Vencer é o que importa, o resto é consequência".

É de fato uma vergonha o que esses brasileiros estão fazendo na F1, seja o episódio do Rubinho na Áustria 2002, o do Piquet, em Cingapura 2008, ou o Massa, em Alemanha 2010.
Nenhum piloto brasileiro anteriormente se submeteu a tamanha vergonha que esses caras me aprontam na F1. Não merecem ser campeões os que tais coisas praticam.

thiago disse...

mas eles tem que intender o lado do torcedor também , nós tivemos o Senna , eu vi Senna correr , é difícil pro torcedor ver tudo aquilo e não querer mais , como disse o próprio Senna uma vez , a vitória é como uma droga , depois que vc sente o gosto dela fará de tudo pra ter de novo , o mesmo vale pros torcedores , estamos carentes de ídolos no país , que já teve tantos e agora não tem nenhum e isso frustra o torcedor