A FIA não quis saber de cerimônia para revolucionar o esquema aerodinâmico dos carros da Fórmula 1.
A entidade aprovou uma significativa queda do uso da pressão sobre o ar exercido pelos componentes do carro. Basicamente, alterou-se o desenho dos poderosos difusores e limpou-se a escamosa carenagem, que antes abrigava os mais variados penduricalhos lançados pela engenharia.
À primeira vista, os novos aerofólios causaram enorme sensação de estranheza. À segunda vista também. À terceira, nem se fala. Sim, ficou esquisito. Mas quando todos estão feios, os menos feios se tornam bonitos, e aos poucos tentamos nos acostumar.
Até o ano passado, quando um piloto perseguia o adversário em curvas de média e alta, perdia bastante pressão aerodinâmica somente na parte dianteira, graças à turbulência emitida pelo carro da frente. A instabilidade provocava um terrível desequilíbrio, que minava as chances de aproximação na reta, impedindo a ocorrência da ultrapassagem.
A Federação montou um inteligente grupo de trabalho capaz de propor soluções eficazes. A asa frontal ganhou largura e se aproximou do chão, maximizando o efeito solo. Já o vilão da área traseira foi encurtado na horizontal e elevado na vertical. Assim, é provável que as tão almejadas ultrapassagens voltem à rotina da categoria, dando um pouco de descanso a São Pedro, que tanto colaborou com o espetáculo da F-1 na temporada anterior.
Otimismo é aceitável, mas não esperem que o diretor de imagens da FOM se desespere com uma infinidade de ultrapassagens numa volta só.
A perda de pressão aerodinâmica na frente será reduzida, é verdade, porém existe a tendência de o piloto de trás passar a sofrer um ligeiro desequilíbrio na traseira também, num fenômeno mais semelhante ao da GP2. Nada que piore a instabilidade vivida até 2008.
Com o novo formato do spoiler de trás, o vácuo oferecido na reta tende a ser um pouco menor, consequentemente o piloto da frente deverá "puxar" menos o piloto de trás. Mais um exemplo de que o ganho não é pleno.
As equipes devem ficar atentas às zebras mais altas, sobretudo a Toyota, uma das poucas escuderias que optou pelo bico fino. A extremidade da asa está bastante baixa e pode sofrer danos nas curvas, a exemplo do incidente já ocorrido com o time japonês num dos testes coletivos da pré-temporada.
Será exigido bastante cuidado por parte dos pilotos em situações como largada e ultrapassagem. Simplesmente é impossível saber onde começa e onde termina o spoiler dianteiro; a visão do cockpit não lhes dá essa permissão. A largura da asa é maior que a distância entre os pneus de fora a fora. Assim que as luzes vermelhas se apagarem, o risco de toque será relevante.
Quando um competidor estiver em posição de ataque na reta, também precisará desconfiar dos movimentos de sua vítima. Os hamiltons da vida, que se mexem para todos os lados na tentativa de defender a posição, oferecerão uma séria ameaça à integridade do aerofólio frontal, que costuma passar a poucos centímetros da traseira, já que o piloto maximiza o vácuo antes de se colocar lado a lado. Os míseros centímetros que se tinha de sobra talvez não existam mais.
A grande permissão aerodinâmica do ano é o mecanismo de ajuste da asa dianteira diretamente do cockpit. O que antes só podia ser realizado pelo mecânico durante as paradas de boxes, poderá ser feito pelo piloto incansavelmente. Ele tem 6 graus para movimentar até, no máximo, duas vezes por volta.
Some-se a isso o botão push-to-pass e os competidores ganharão mais dois recursos para brincar antes e depois das curvas. É bom não se esquecer das marchas, da distribuição de freios e mais umas dezenas de comandos que exigem um malabarista no controle do carro. A temporada será exaustiva e o engenheiro deve buzinar como nunca nos ouvidos de seus pilotos.
Pilotar é esporte, mas às vezes não deixa de ser uma arte.
3 comentários:
Felipe, seus textos técnicos são muito bons.
Só tenho um complemento.
"A Federação montou um inteligente grupo de trabalho capaz de propor soluções eficazes. A asa frontal ganhou largura e se aproximou do chão, maximizando o efeito solo. Já o vilão da área traseira foi encurtado na horizontal e elevado na vertical."
O Overtaking Working Group (Grupo de Trabalho de ultrapassagem) , estimou (tudo simulação, não se sabe a situação real ) que antes das mudanças, era necessário aproximadamente que um carro que estivesse efetuando a ultrapassagem andasse a 1.5~2s mais rápido que o carro na frente, somando a instabilidade causada no ar carro da frente, a ultrapassagem estava sendo complicada.
Após as mudanças , me parece que o "problema" foi reduzido para 1s~1.5s... Como vc mesmo disse, não adiantará muito, mas será alguma coisa. Soma-se ao "KERS" , teóricamente deve ajudar nas ultrapassagens. Mas é tudo teoria... Vamos ver como será nas corridas. Creio que estamos todos torcendo a favor.
Independentemente dos carros estarem feios ou não !
Abraços !
Os carros não estão nada vistosos, mas tudo em pró da competitividade. Estes riscos ficaram muito claros desde cedo, mas não se sabe ao certo o que vai acontecer. Somente a partir de Melbourne saberemos ao certo qual será o real efeito das novas exigencias aerodinâmicas.
Abraços!
Leandro Montianele
Só acredito que estas restrições vão proporcionar mais ultrapassagens quando essas acontecerem em Melbourne.
Grande Abraço!
Kimi_Cris
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